O suor lhe escorria o rosto, a faca ainda estava em suas
mãos. Ali parado, olhado o corpo dela desfalecido, sentindo o rosto respingado
de sangue, o ódio que minutos antes tomava conta dele foi aos poucos sendo substituído
pela noção exata do que fizera. Andava em círculos com as mãos junto a
cabeça imaginando o que fazer, tentando entender onde perdera o controle
para chegar aquele ponto.
Ana e Luiz se conheceram numa festa, ficaram juntos e de
tanto ficarem estabeleceram um relacionamento, ela sempre falava do tamanho do
seu amor por ele e só ao lado dela ele se sentia feliz e completo. Quando ela
começou a se afastar dizia apenas que os afazeres diários estavam ocupando seu
tempo mas que ainda o amava como antes. Ele havia se afastado dos amigos e da
família e sua vida agora girava em torno dela e cada noite que passava em casa
era um martírio de sofrimentos onde acordado tentava encontra-la na cama. Ela,
quando o recebia dizia estar cansada para o amor. Numa noite, cansado de estar
só, Luiz foi até a casa dela, ele sabia onde a chave estava e a porta era silenciosa.
Entrou com cuidado por pensar que ela estava dormindo as duas da manhã. Ouviu
alguns barulhos, ela estava nua, entregue sobre o corpo de um estranho no tapete
da sala.
Ele saiu da mesma maneira que entrou, possuído pela raiva, sem rumo pelas ruas com um olhar de dar medo a quem o visse. Em sua casa,
ligou para ela e disse que queria vê-la, ela disse que estava cansada, ficara
até tarde preparando trabalhos de faculdade e não queria vê-lo pois não seria
boa companhia. Ele insistiu mas ela não permitiu.
Durante alguns dias ele fingiu não saber e ela permaneceu
mentindo, então, ela precisou de ajuda e veio a sua casa, dormiram juntos e
então ela disse sobre o favor que precisava. A semana fora ótima e ele quase
esqueceu o que tinha visto, então ele terminou o que ela lhe pediu e a ausência
voltou a acontecer. Parado em frente a casa dela percebeu quem era o homem que
a visitava. No outro dia foi conversar com ele fingindo não saber e em meio a conversas ele
contou que estava namorando uma linda mulher que estava saindo de um
relacionamento conturbado com um rapaz que nunca amara, disse que ela ainda não
tinha conseguido terminar definitivamente com ele mas já não dormiam juntos a
quase um ano.
Luiz não conseguiu aceitar, aquelas palavras ardiam a seus
ouvidos, foi a casa de Ana e ela relutou em recebê-lo pedindo que fosse embora.
Ele insistiu na conversa, ela disse que o amava e ele disse que sabia de tudo,
ao invés de admitir ela permaneceu mentindo dizendo que estava decepcionada com
ele por não acreditar no que ela dizia. Quando não havia mais como negar, ela
gritava dizendo que ele tinha invadido a privacidade dela entrando em sua casa
sem o seu consentimento, ele gritava palavrões e ela deu as costas para ele
dizendo que a conversa estava terminada e que iria fazer o seu jantar. Luiz a
seguiu e ela admitiu a verdade zombando dele, ele a segurou pelo pescoço, ela
pegou a faca que estava em cima da pia, ele tomou a faca dela e antes que
pensasse no que estava fazendo Ana já estava no chão esfaqueada se esvaindo em
sangue.
Sem saber o que fazer, Luiz fugiu, mas a culpa o alcançou
antes que alguém soubesse o que tinha acontecido, com as roupas ainda sujas de
sangue foi ao morro mais alto que encontrou, teve medo, teve receio, mas não
conseguiria viver num mundo sem ela, num mundo sem amor, num mundo em que ele
fosse responsável por tirar uma vida. Foi então seu próprio juiz e se atirou da
montanha. Há coisas que não tem perdão, há atitudes que não há como voltar e
ele sabia disto. Enquanto caia ele pensava nela, pensava em si e entendia que
fora uma atitude covarde mata-la e mais covarde ainda se atirar daquela maneira,
entendeu então que não era um homem e sim um garoto e percebeu que não tivera
coragem nem mesmo de enfrentar as consequências dos seus atos.
Autor: Arthur Lingard
Nenhum comentário:
Postar um comentário